ubalab
Durante as preparações do Festival Tropixel, no ano passado, surgiu o tema da qualidade da água nos rios de Ubatuba. Em particular falava-se sobre o rio Acaraú, que vem lá da Sesmaria já perto da serra, passa ao lado da Estufa II - onde está localizada uma estação da SABESP -, e em seguida também recebe as águas que vêm do córrego da Praia Grande, para enfim atravessar a Rio Santos, cortar o bairro do Itaguá e desaguar no mar. Por conta do próprio trajeto do rio, grande parte das conversas sobre a poluição de suas águas - e em consequência do mar no Itaguá - está carregada de preconceitos e desconfianças. Um dos objetivos do Ensaio Tropixel era experimentar com possibilidades de gerar dados concretos que possam ajudar nessas conversas.
Durante o Tropixel em outubro, a pedido de representantes do Itaguá Azul - organização que sugere que o Acaraú é um dos maiores responsáveis pela poluição da baía no centro de Ubatuba -, organizamos uma reunião com alguns dos pesquisadores e artistas presentes ao Festival. Estavam na reunião os finlandeses Tapio Mäkelä e Mikko Lipiäinen, Karla Brunet e Javier Cruz do Ecoarte na UFBA e Guima-san do Gypsyware. Durante a reunião, me recordo de ter escutado do pessoal do Itaguá Azul a frase "nós queremos ter acesso a essa tecnologia". A tal tecnologia era a possibilidade de monitorar de maneira continuada a qualidade de água do rio. Escutamos que o problema das análises usuais é que elas são episódicas, o que insere variáveis demais no cenário. Os convidados do Tropixel trouxeram várias perspectivas para a questão, falando sobre sensores digitais de baixo custo, credibilidade de soluções alternativas e possibilidades de mobilização a partir de dados levantados. Mesmo sem planos definitivos de sequência do Tropixel - à época estávamos pensando em uma segunda edição do Festival já no primeiro semestre de 2014, mas ninguém tinha disponibilidade de tempo para fazer isso acontecer -, ainda assim decidimos que faríamos alguma coisa no mês de abril.
Na sequência do Festival, eu também estava conversando com o pessoal do Labmovel (na verdade era uma conversa mais antiga, que começou em 2012 durante o Circuito Artemov no Rio de Janeiro, ou bem antes). Eles estavam planejando as ações para este ano, e acabamos por entrar em acordo a respeito de um evento em Ubatuba. Acabamos aproximando as duas iniciativas no que veio a ser a primeira edição do Ensaio Tropixel. Concentraríamos nosso foco nas possibilidades de monitoramento de qualidade de água, e os testes do piloto seriam no rio Acaraú. O Labmovel ofereceria uma oficina - com o artista Fernando Velázquez - utilizando celulares e drones para fazer filmagens aéreas e mapeamentos, e o Ubalab convidaria Guima-san para trabalhar com sensores junto à realização da oficina. Tive algumas conversas com integrantes do Itaguá Azul, que ofereceram mais dados e confirmaram o interesse no evento.
A questão dos sensores é relativamente complexa: não existe um sensor específico que detecte "poluição" na água. Em geral, utilizam-se diversos indicadores. Podem ser levadas em conta medidas como PH, oxigênio dissolvido, temperatura, composição química do fundo do rio, aparência e cheiro da água, entre outros. Mas como estávamos trabalhando em um período curto, e em um primeiro protótipo que futuramente pode evoluir para uma solução mais completa, decidimos nos concentrar no oxigênio dissolvido. Adquirimos, por intermédio de uma conhecida do Leandro Ramalho, um kit de medição para conectar a uma placa arduino.
A programação do Ensaio Tropixel começou no meio da semana, com uma oficina de hardware livre e sensores que Guima-san ofereceu aos meus alunos do primeiro ano no curso técnico de informática da Escola Tancredo Neves. Mostrou algumas possibilidades com arduinos, sensores, ativadores e afins. No dia seguinte, reunimos um grupo de pessoas interessadas em tecnologia na cidade de Ubatuba no Espaço Tec da Biblioteca Municipal para fazer os primeiros testes com o sensor de oxigênio dissolvido. O kit que estávamos usando traz junto um líquido de calibragem. Após ligar o sensor, utiliza-se o líquido para zerar a leitura. Depois, cada leitura demora cerca de dois minutos para estabilizar-se. Ao fim da noite, já havíamos conseguido obter algumas medições. Guima e Leandro chegaram até a desenvolver um script em python para obter as medições utilizando um velho tablet que tenho aqui, mas no dia seguinte acabamos deixando essa solução de lado por motivos de confiabilidade no hardware.
No fim de semana, Labmovel já estava pela área. Encontramos os participantes da oficina no Tancredo para contextualizar e demonstrar algumas aplicações de informação georreferenciada. Dos 27 inscritos, apareceram menos de 10 - mas isso faz parte de um sábado de sol em Ubatuba, eu suponho. Havia principalmente estudantes da Etec - Centro Paula Souza, e do Tancredo. Senti falta em especial de mais integrantes de organizações interessadas nas condições do Acaraú que pudessem nos ajudar a acessar os pontos críticos para avaliação da qualidade da água - como aqueles antes e depois da estação da SABESP. Sem esse conhecimento de campo, acabamos focando somente em outros três pontos: na confluência do córrego da Praia Grande com o Acaraú (onde o rio passa por debaixo da Rio-Santos); na rua Basílio Cavalheiro e no ponto onde ele deságua no mar. Estávamos conscientes de que uma medição pontual não significa nada, mas estávamos tratando aquilo como um protótipo que deve ser ampliado futuramente. Guima chegou a estudar a possibilidade de fazer sensores com material reciclado ou de baixo custo, mas isso vai ficar para um segundo momento. Da mesma forma, a ideia de fazer diversos sensores interconectados em rede, alimentando um sistema online, precisaria de mais tempo e investimento para ser implementada a contento.
De todo modo, saímos para fazer as medições com um grupo animado. Alguns ajudavam a coletar amostras da água, o que exige delicadeza. Qualquer agitação na amostra já pode modificar os níveis de oxigenação. Outros ajudavam a preparar o contexto, encontrar pontos de interesse, ou então acompanhavam os voos do drone Phantom 2 comandado por Fernando Velázquez. Duas alunas carregavam celulares com GPS registrando o trajeto e fazendo imagens já georreferenciadas ao longo do caminho. Ao fim da tarde, já tínhamos um quadro que confirmava o que esperávamos. No trecho perto da Rio-Santos, os níveis de oxigenação da água do Acaraú são horrendos. Dali para a frente, a água melhora um pouco até saír para a baía - ainda poluída, mas já razoavelmente melhor. Infelizmente, não fizemos as medições acima da estrada - onde elas seriam ainda mais necessárias. Mas como prova de conceito já funcionou muito bem. Foram geradas também algumas imagens aéreas interessantes para contribuir com o mapeamento do rio.
Na manhã do domingo, o Labmovel instalou-se no terminal marítimo no canto direito do Itaguá para demonstrar resultados da oficina. Fernando Velazquez exibiu algumas imagens aéreas captadas na tarde anterior. Guima contou sobre os testes com sensores e alguns conceitos por trás. Eu demonstrei o mapa que montei na plataforma Mapas Coletivos com imagens e trilhas registradas. O secretário do Meio Ambiente de Ubatuba, Juan Prada, estava presente e contou mais sobre o rio Acaraú e outros rios da cidade.
Como primeira experiência de evento menor e mais focado, o Ensaio Tropixel foi bastante interessante. Ajudou a conscientizar algumas pessoas a respeito de condições físicas do rio - incluindo seu traçado, e implicações do desenvolvimento urbano sobre ele. Mas fundamentalmente permitiu um pouco mais de aprofundamento do que um festival no qual diversos assuntos competem uns com os outros. Para mim particularmente foi uma oportunidade de aprender sobre alguns temas técnicos. Mais ainda, aprendi sobre diferentes camadas da composição não somente do rio como também de seu entorno ambiental, institucional e de imagem. Certamente, as próximas edições do Ensaio Tropixel já serão influenciadas por estas descobertas.
Veja também a documentação gerada pelo primeiro Ensaio Tropixel:
- Fotos da oficina por Labmovel;
- Vídeos aéreos de Velázquez: voo 1; labmovel; último dia;
- Registro das leituras do sensor de OD;
- Fotos da minha câmera e de outras câmeras usadas pelos participantes da oficina;
- Mapa com material gerado na oficina.
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O Ensaio Tropixel #1 foi uma parceria entre Ubalab e Labmovel, e contou com o apoio da Escola Municipal Tancredo Neves, Prefeitura de Ubatuba e Ecotrip Hostel. Labmovel esteve em Ubatuba com apoio da Secretaria Estadual de Cultura, dentro do Programa de Ação Cultural 2013.
Com o objetivo de continuar e aprofundar as colaborações que surgiram a partir da realização do festival Tropixel em outubro passado, estamos elaborando uma programação mais focada e em pequena escala. São os Ensaios Tropixel, dedicados a desenvolver ideias e concretizá-las. A primeira edição acontece no fim de semana de 5 e 6 de abril, aqui em Ubatuba, e será realizada em parceria com o Labmovel. Saiba mais sobre o Ensaio Tropixel #1 e participe!
Coordenação: Felipe Fonseca
29/3 - sábado - 10h às 17h (pausa de 1h para almoço)
Público: interessados na técnica da cartografia para fins culturais
Inscrições: 7/1 a 21/3
Seleção: primeiros inscritos
25 vagas
Local: Rua Coronel Domingues de Castro, 33 – Centro
São Luiz do Paraitinga
Em tempos recentes, uma série de novas tecnologias digitais vem possibilitando a utilização de informações geográficas para repensar o lugar do indivíduo e da comunidade no mundo. Esta oficina promoverá reflexões sobre o papel dos mapas digitais na sociedade contemporânea, expondo usos criativos da cartografia como elemento de identidade e engajamento social.
Felipe Fonseca é mestrando em Divulgação Cientifica e Cultural (Labjor-Unicamp), pesquisador, curador, escritor e articulador de projetos de apropriação crítica de tecnologias digitais, laboratórios de mídia, arte eletrônica, cultura digital experimental e colaboração em rede. É cofundador da rede MetaReciclagem (2002), do coletivo Desvio (2009), do blog Lixo Eletrônico (2008), da plataforma Rede//Labs (2010) e de diversas outras iniciativas, como o núcleo Ubalab, o coletivo editorial MutGamb e a rede Bricolabs.
Litoral Sustentável - Turismo de Base Comunitária. from Pedro Bayeux on Vimeo.
"... A partir da discussão de como agregar valor social e cultural aos programas turísticos tradicionais e também para fomentar o turismo com base comunitária, através da formação de redes, de modo que as comunidades, como indígenas, quilombolas ou caiçaras, protagonizem a oferta de produtos turísticos..."
Concepção: Felipe Fonseca, Maira Begalli, Pedro Bayeux.
Direção, edição, cinegrafista: Pedro Bayeux.
Cinegrafistas: Marco Estrella, Erik Nagamine.
Som: Ladislau Kardos, Erik Nagamine.
Trilha original: Renato Cortez.
Produzir o festival Tropixel tem sido uma jornada incrível. O ritmo se intensificou nos últimos dias. Tenho feito jornadas extensas (ontem mesmo comecei às oito e quinze, e ainda não parei agora, quase duas da manhã de um novo dia). Além da comissão organizadora do festival que me acompanha, quase toda à distância, há meses, agora a Malu Andrade também chegou para somar. Hoje de manhã a Carolina Striemer me acompanhou pela cidade colando cartazes, e à tarde nossa filha me acompanhou por aí, negociando, conversando com as pessoas, chamando cada vez mais gente.
Tenho cada vez mais certeza de que o festival vai reverberar por muito tempo nessa cidade. Me parece que mesmo que a gente cancelasse tudo agora e nenhum dos convidados de fora aparecesse, ainda assim já veríamos muitos resultados. A aspiração dessa cidade por transformação, pelo reconhecimento de seus méritos e pelo desenvolvimento de seus talentos já está aqui, latente. Nessa preparação do festival, fiz mais de uma vez movimentos pequenos de aproximação entre pessoas que já deveriam ter se aproximado antes, mas faltava só aquele empurrãozinho. Toda essa projeção, esse exercício de imaginar futuros melhores para Ubatuba, para as pessoas que vivem aqui e para a natureza que a preenche e transborda pode acontecer pelas cabeças e mãos das pessoas daqui, se nós simplesmente começarmos a trabalhar juntos.
Ainda assim a gente quer trocar, a gente quer aprender, a gente quer interferir e criar. Daqui até o fim do mês a cidade está repleta de acontecimentos. O Tropixel é só mais um deles. Mas é um acontecimento de peso. Vamos receber entre quarenta e cinquenta pessoas envolvidas diretamente com uma ou outra atividade do festival. Ou seja, não são espectadores e nem meros turistas, não são pessoas só de passagem por aqui. São ativistas, pesquisadorxs, cientistas, artistas, produtorxs culturais. Gente que faz a diferença, em muitos lugares do mundo. Gente que vem para unir forças a todo mundo que tenta entender e melhorar Ubatuba.
Começaremos o festival na segunda-feira, dia 21, com um painel importante sobre Políticas Culturais e Transformação Social. A ideia é refletir sobre como o fazer cultural pode apontar caminhos para um modelo de desenvolvimento que seja includente, colaborativo, sustentável e solidário. Teremos a presença de Celio Turino, criador - lá se vai uma década - do programa Cultura Viva, que implantou os Pontos de Cultura; e de Americo Cordula, Secretário de Políticas Culturais do Ministério da Cultura.
Na terça o festival conta com o Seminário Sincronizando..., que traz discussões contemporâneas sobre cidade, resíduos eletroeletrônicos, bioarte e turismo sustentável. Nos dois dias seguintes, a cidade é tomada por projetos experimentais: explorações fotográficas, investigação de campo, desenvolvimento de tecnologias, oficinas, mapeamentos, projeções, intervenções urbanas, criação performática, troca de conhecimentos e muito mais. A quarta-feira se encerra com um Fórum, organizado em parceria com a Prefeitura, sobre planos de desenvolvimento de tecnologias em Ubatuba. Na quinta, vamos lançar a segunda edição da Facta - revista de Gambiologia. O Ônibus Hacker e o Labmovel circulam pela cidade com oficinas e projetos.
Na sexta-feira, dia 25, todos os times que se espalharam pela cidade reunem-se para promover a OCUPA. - ocupação cultural do Perequê-Açu. Vamos transformar, ao menos por um dia, o terminal turístico que ficou tanto tempo abandonado em um centro cultural comunitário, vibrante e dinâmico.
Alguns participantes (e o Ônibus Hacker) vão até estender sua visita a Ubatuba, para prestigiar o aniversário da cidade na segunda-feira.
Todo esse texto somente para contar que a programação está praticamente finalizada. Acessem aqui: http://tropixel.ubalab.org/ubatuba
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E para não perder a viagem, se alguém leu TUDO ISSO e se interessou, confesso que o festival ainda precisa resolver algumas coisas. Tomamos a decisão de contemplar o máximo possível de propostas enviadas ao festival. No momento, estamos com condições de cobrir o transporte e a hospedagem de quase todas entre aquelas dezenas de pessoas que mencionei acima. Mas ainda faltam recursos para bancar a alimentação, o material para algumas oficinas e mais algumas coisinhas. A gente queria arrecadar muito mais do que conseguimos com a vaquinha online - e eu agradeço profundamente às doações significativas que por ali apareceram. Mas não tivemos condições de dar tanta atenção assim à divulgação dela. Ainda assim, vamos mantê-la no ar. Se o processo do Tropixel vale alguma coisa para você, peço que nos ajude a garantir o bem estar de nossos convidados na próxima semana. Hospedagem solidária; almoços pagos; doações de pizzas, esfihas e afins serão aceitas. Dinheiro, naturalmente, também: http://tropixel.ubalab.org/pt-br/apoio
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